Semana de Oração pela Unidade Cristã: uma oportunidade para redescobrir que somos todos irmãos!
“Amado e misericordioso Deus pai e mãe, Tu nos chamas para vivermos a unidade e a reconciliação. Por isso estamos reunidas (os) para celebrar, orar, e Te louvar. Nesta semana de oração, queremos ser tocadas (os) por Teu Amor e ao permanecer Nele, nos reconciliamos conosco e com nossas irmãs e irmãos. Em Cristo, Teu Amado Filho, desejamos produzir bons frutos para vivermos em comunhão, restabelecendo relações de amizade, partilha e solidariedade e, assim, nos reconhecermos como irmãs e irmãos neste mundo tão dividido”.
(Oração para Semana de Oração pela Unidade Cristã, 2021)
Queridos irmãos e irmãs, irmanados pelo santo Batismo que nos faz Povo de Deus, temos nesses dias, de 16 a 23 de maio, na Semana de Oração pela Unidade Cristã que tem como tema: “Permanecei no meu amor e produzireis muitos frutos” (cf. Jo 15,5-9), uma bela oportunidade de revisitar o grande tema que urge ser abraçado e praticado por todos os cristãos: o Ecumenismo. A Semana de Oração pela Unidade Cristã é um dos maiores eventos globais que propõe o diálogo entre membros de igrejas cristãs. Realizado todos os anos, o momento é uma oportunidade de aprofundar laços entre igrejas e movimentos sociais que se identificam com essa cultura do encontro e da acolhida (cf. site da CNBB).
O Ecumenismo não é um adendo na vida da Igreja ou apenas uma de suas características, mas faz parte da sua essência, do seu modo de ser e de agir, pois sem o diálogo e o respeito não se pode construir uma sociedade de paz e de justiça, muito menos encontrar a riqueza daquilo que nos une, evitando a polêmica do que nos divide. Para isso, é preciso voltar os olhos para Aquele que “passou fazendo o bem” (Cf. At 10,38): Jesus de Nazaré.
A oração de Jesus, conhecida como oração sacerdotal, no capítulo 17 do Evangelho de João, abarca não apenas um pedido ao Pai para que os discípulos permanecessem na unidade, mas também coloca a própria comunhão como elemento fundamental para que o mundo tenha fé de que Ele é o Messias, o Filho do Deus vivo (Cf. Mt 16,16).
Entretanto, a unidade, querida por Jesus e “sacramento” daqueles que são discípulos do Senhor – “nisto reconhecerão todos que sois meus discípulos se tiverdes amor uns pelos outros” (Jo 13,35) –, foi, ao longo da história do Cristianismo, sendo maculada por pensamentos, posições e atitudes que geraram feridas e rompimentos que persistiram por séculos sob o véu das condenações, da intolerância e do próprio ódio. E hoje, mesmo com caminhos já trilhados e diálogos estabelecidos, a ferida das divisões não foi curada totalmente, deixando o caminho para a Unidade uma estrada frágil de se percorrer.
No alvorecer do Concílio Vaticano II (1962-1965) essas brigas, acusações e distâncias deram lugar a uma bonita, ainda que frágil, estrada de diálogo, compreensão e respeito entre as várias denominações cristãs. Acerca da relação entre as Igrejas Cristãs (Históricas) e a Igreja Católica, na qual “o pontificado de João XXIII inaugura a mudança, [...], diante do já existente Movimento Ecumênico e do diálogo com as religiões não cristãs” (Teólogo Walter Kasper), passos foram dados na busca de uma melhor compreensão de que existe a possibilidade de pautados na fé, viver em harmonia como irmãos e irmãs, mesmo que com vivências religiosas diferentes.
Nesse sentido, na Exortação Apostólica Evangelli Gaudium (244) afirmou o Papa Francisco: “Devemos sempre lembrar-nos de que somos peregrinos, e peregrinamos juntos. Para isso, devemos abrir o coração ao companheiro de estrada sem medos nem desconfianças, e olhar primariamente para o que procuramos: a paz no rosto do único Deus”.
Debruçados na história do Cristianismo, percebemos claramente que essa bonita e mística estrada também foi e, infelizmente, continua sendo, marcada por conflitos que geraram amargas divisões, tendo o outro sempre como um inimigo a ser combatido, condenado e eliminado.
Por isso hoje, diante desse cenário polarizado em que se encontra o mundo e, de modo especial o Brasil, precisamos redescobrir que professamos a mesma fé, e precisamente esta fé deve impulsionar todos os cristãos para uma verdadeira mudança da sociedade, transformando as realidades de sofrimentos, de injustiças, exclusões e mortes que persistem maculando a vida e a dignidade dos filhos e filhas de Deus.
É preciso entender que, na pluralidade religiosa, é óbvio que existe a dificuldade do diálogo, e essa dificuldade pode fazer crescer a intolerância e o fanatismo, levando os cristãos à ofensas e condenações recíprocas. Por isso é recordamos o que disse o Papa Francisco: “O fundamentalismo é uma doença que se encontra em todas as religiões. Nós, os católicos, temos alguns, na verdade muitos, que creem que têm a verdade absoluta consigo e saem a sujar os outros com difamação e a calúnia, e fazem muito dano [...]. O fundamentalismo religioso não é religioso. Por que? Porque falta Deus. O fundamentalismo é uma idolatria, como o dinheiro também é”.
Não existe, queridos amigos e irmãos católicos e demais cristãos, outro caminho possível para a edificação de uma sociedade pautada na paz, que não seja pelo viés do diálogo, do reconhecimento e do conhecimento do outro e de um processo verdadeiro de conversão interior, pois somente assim iremos oferecer ao mundo um exímio testemunho do Evangelho, “afinal, os muros que nos separam não chegam até o céu” (Teólogo Yves Congar).
Termino essa reflexão com a oração ecumênica do Papa Francisco encontrada na sua última Encíclica, chamada Fratelli Tutti (somos todos irmãos), na “esperança que não decepciona" (Rm 5,5), tendo a certeza de que é o Espírito Santo que suscita em nós, quando nos abrimos à sua ação, gestos de amor, acolhida e respeito.
“Deus nosso, Trindade de amor, a partir da poderosa comunhão da vossa intimidade divina, infundi no meio de nós o rio do amor fraterno. Dai-nos o amor que transparecia nos gestos de Jesus, na sua família de Nazaré e na primeira comunidade cristã. Concedei-nos, a nós cristãos, que vivamos o Evangelho e reconheçamos Cristo em cada ser humano, para O vermos crucificado nas angústias dos abandonados e dos esquecidos deste mundo e ressuscitado em cada irmão que se levanta. Vinde Espírito Santo! Mostrai-nos a vossa beleza refletida em todos os povos da terra, para descobrirmos que todos são importantes, que todos são necessários, que são rostos diferentes da mesma humanidade amada por Deus. Amém”
Pe. Diego Nascimento Silva
Lecionando 'Eclesiologia' para a turma do 2º ano do curso de Teologia, em nosso Instituto de Teologia. É mestrando em Teologia Prática, com ênfase em ecumenismo, na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Participa do Grupo de Pesquisa 'Religião e Política no Brasil Contemporâneo'' (PUC-SP/CNPQ). Atualmente é vigário paroquial na Basílica de Nossa Senhora da Penha, setor Cangaíba.